(...) na semana seguinte o país foi consumido por uma orgia salazarenga de caridade e devoção. Os sem-abrigo casaram-se em barda, as mães de Cascais fizeram soufflés aos entrevados, a Júlia e o Goucha entrevistaram manetas, tuberculosos e débeis mentais. Os alcoólicos sorveram sopa com cheirinho, muito boa, muito quentinha. Um patego da Guarda trajou de pai natal e deu chocolates do Lidl à terceira idade.
Sim, eu esperava uma epifania e obtive-a: Portugal não está deprimido nem mortificado como se diz por aí. Pelo contrário, Portugal exulta. Portugal está em júbilo, porque bastou um ano de crise para reencontrar os seus pobrezinhos no adro da igreja, os seus velhos de pés em chaga, os meninos escalavrados a lamber o ranho e a estender as mãos. E já tinhamos todos tantas saudades."
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